A Obsoleta Poesia Mais do Mesmo
Rasgue
a velharia torta da poesia insossa e pré-moldada; desse tipo de
macarrão instantâneo que já vem 50% pronto. Longe da iguaria, na
literatura poética isso representa, a meu ver, um desastroso formato
utilizado por inúmeros poetas e poetisas adeptas do “mais do
mesmo”, da fácil, mas apática e cansativa forma, da pouca ou
nenhuma identidade no que se produz, do limitável que se apresenta
desde o formato até o mau uso
das palavras. Sempre quase as mesmas, sempre quase os mesmos temas, o
velho e nauseabundo sentimentalismo… É a imperiosa ordem do
convencional que regi grande parte dos poetas, é o medo do novo,
medo do mau, mas necessário denodado comportamento literário, medo
da ruptura com a norma vigente que pede sempre melodiosos versos,
palavras amenas e sentimentais, estrelas sendo estrelas, olhos sendo
olhos, rosas sendo rosas, saudade sendo saudade… Não há espaço
para o ID, diria Vital Corrêa de Araújo.
Assim,
não há esperança.
Se
deseja se inscrever na história da poesia
poesia (como
também define VCA), repudie os poemas encomendados, os poemas
escritos como se fossem receitas culinárias, prescrição de
manipulados, repudie os temas como se a poesia fosse tal qual uma
redação do Ensino Fundamental, repudie, repudie, repudie!
De
maneira nova, a palavra dicionarizada, tão insossa e tão utilizada
de forma ordinária para repetir o que já foi dito, aqui vai um
neologismo, zilhões de
vezes, deve trazer na sua face novo significado estético, ou mesmo a
desconstrução do preestabelecido, tem-se medo de pintar o tronco da
árvore de roxo e sua copa de rosa vivo e insurgente, tem-se medo de
pintar os campos de azuis inimagináveis.
Romper
com a forma preponderante moldada pelos séculos, não é fácil. Mas
é possível. É possível visto que na literatura tudo se pode.
Visto que na arte tudo se pode. Não há moralismo, ética, pudores,
regras fixas na arte (refiro-me à expressão do artista); aqui, no
entanto, não falemos das multilinguagens da arte, nem mesmo da
literatura enquanto prosa. Mas da Poesia.
É sobre isso que discorre esta breve reflexão. É aqui onde está o
tema deste discurso. Poesia desembolorada, desemcapada, destampada,
desnorteada, desfabricada, desconstruída. Poesia pungente, repleta
de singularidade. Não precisam os ouvidos ou os olhos dos ilustres
leitores e leitoras do mesmo “blá-blá-blá”,
(gosto das onomatopeias) de sempre, precisamos servir originalidade
nos versos, comovente adaga que fira, que retorça a racionalidade,
que sopre do juízo do ouvinte a pasmaceira, a intragável delicadeza
dos aljôfares, das rosas cálidas, do amor platônico, piedoso ou
não correspondido que nutre em si a fácil efemeridade do comum.
Rasgue
a velharia obsoleta que não dá a devida identidade ao texto
poético, desfaça-se de tudo que impede sua fluidez, que impede a
anástrofe natural da palavra na busca da palavra
plena e
suficientemente capaz de neutralizar o fútil emprego no verso do seu
habitual significado. Se escreves, rebela-te! Se és leitor, leitora,
rebela-te também! Não aceites tão pouco de um universo que deve
trazer pra tua voraz prática a beleza perpétua da grande literatura
poética. Os incomensuráveis versos que têm poder de te revirar ao
avesso, de te lançar a outras instâncias de prazer e fascinante
universo desconhecido. O êxtase diante do belo, o sabor do espanto
preso à língua que prova no silêncio o poema mais imensurável e
febril, só é possível ser encontrado na poesia que rompeu suas
amarras e lançou-se em direção aos abissais mundos sombrios e
delirantes dos oceanos da liberdade poética.
Rebela-te!
Jacqueline Torres
Imagem de arabesco - Disponível em: https://www.deviantart.com/ariadna21/art/Arabescos-PNG-04-698577785