quinta-feira, 20 de março de 2014

Invasão

POEMA DE INVASÃO


 Gravura: Anne-Julie Aubry

Por que caminhas com teu rastro de pedra a minha volta?
Por que sopra de teus cílios um vento ondeado de azul e cinza
                        que entorna meus cabelos?
Entras furtivo nos meus sonhos
e rouba-me os beijos mornos que guardo
                        com palavras veladas,
                        pra dizer ao teu ouvido distante e impreciso
Por que me sequestras pra morosidade de tua voz
                        armadilha tosca
                        ventania de flores
da qual fujo e me enveredo e me precipito mais e mais?
Por que me feres com teu riso?
Por que me privas da mobilidade
                        sem que me detenhas?
Por que teço perguntas num papel áspero pra descrever a suavidade
                        de nuvem vespertina de teus olhos?
Por que minha mão em fuga, cerze inábil poema de areia?
Palavras... Palavras... Palavras...
Meu coração com voz de cacimba responde de água cristalina e fria
                        sob o lodo tátil toda a resposta,
e guardo-a delicadamente sob as pétalas azuis e roxas
                        de flores escondidas no meu peito.
Invadiste-me.
Nada mais pergunto

nada mais posso dizer de ti.   

Jacqueline Torres